Nas palavras dos outros, está o génio que não temos. Especialmente nas de Vergílio Ferreira. Que parece que quantas mais palavras mostra, mais genialidade manifesta. Não por dizer grandes coisas. Não por teorizar demasiado. Antes por falar de coisas simples, de forma simples, agrupando ideias simples. Ao ponto de, a cada passo, perguntarmos «como é que nunca tinha pensado nisto desta forma». É esta a vantagem que quem não espera nada tem. A de, facilmente, se surpreender. De encontrar muito mais do que aquilo que procura. Há muitas palavras de Vergílio sobre música. Mas, de todas, estas são as mais marcantes.
«Todas as formas de arte existem no presente em que as contactamos, ainda que nos remetam para outro tempo. Mas a música vem logo da distância, não existe no momento em que a ouvimos, mas num tempo que não sabemos. A música é sempre anterior a si, de tempo nenhum, de um absoluto não presentificado, de um tempo anterior ao tempo, de um tempo fora dele, da eternidade. Será por acaso que ela é uma forma de arte privilegiada pela religião? Arte dos deuses, ela é do que imaginamos maior do que nós, do que nos transcende para o absoluto que nos mora.»
Vergílio Ferreira – Pensar