Conferência de João Ferrão marca o início da actividade do Círculo Mais Democracia
João Ferrão, professor e investigador da Universidade de Lisboa, e anterior Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades, foi o primeiro orador das «Conferências de Arouca», promovidas pelo recém-criado movimento cívico «Mais Democracia». A conferência «Construir o futuro em Arouca», que serviu também para assinalar o arranque das actividades do movimento, decorreu no auditório da loja interactiva de turismo, no passado dia 7 de Fevereiro. A sessão foi moderada por Manuel Brandão Alves, arouquense, membro fundador do Círculo e professor catedrático da Universidade de Lisboa, e contou com várias presenças ilustres, com relevo para Manuel Sobrinho Simões (também ele membro fundador do grupo), bem como o presidente e a vice-presidente da Câmara Municipal.
Começando por afirmar que o título poderia ter «tanto de demagógico como de pedagógico», o orador tomou, desde logo, a iniciativa e «a responsabilidade de lançar a conversa», mais do que manter o tom de aula ou palestra. «Construir o futuro em Arouca significa, desde logo, que o futuro é construído em todo o lado, mas também em Arouca. E nós sabemos como as condições de construção do futuro são desiguais, são completamente assimétricas, e que há quem decida o futuro muito mais do que nós», afirmou João Ferrão. Assim, construir o futuro em Arouca não é o mesmo que construir o futuro em outros locais (o que pode levar a uma visão demagógica), mas é uma responsabilidade local contribuir para essa construção (onde intervém a vertente pedagógica).
«Os mapas cognitivos impedem-nos de ver mais longe»
Utilizando a metáfora da caixa de ferramentas, João Ferrão alertou para a forma como, muitas vezes, encaramos o país e os territórios. «Posso falar sobre a caixa de ferramentas e a sua potencialidade, mas se não a abrir e não dispuser das ferramentas para os seus fins, de pouco serve», afirmou, para demonstrar que «muitas vezes é quem vem de fora que nos mostra as limitações que impomos a nós mesmos, e isso, frequentemente, chega a ter impactos nas políticas públicas».
Neste ponto, o orador alertou para a forma menos correcta como são discutidos os problemas do país, «olhado como um ponto», à luz das políticas macroeconómicas e financeiras. «Não podemos discutir qualquer perspectiva a partir de um ponto», afirmou João Ferrão, porque «o futuro do país constrói-se a partir da diversidade».
O futuro
«O futuro não se prevê, o futuro constrói-se» foi a frase-chave que o professor e investigador da Universidade de Lisboa usou para caracterizar uma visão do futuro que já perpassa por algumas franjas da sociedade. «É necessário um esforço colectivo para que o impossível aconteça, mesmo nestes tempos de instabilidade e imprevisibilidade», afirmou, acrescentando que «a economia não pode ser um fim em si mesma, mas um meio, organizado, para atingir o fim (o bem-estar)».
Neste ponto, João Ferrão destacou a importância da economia verde, do desenvolvimento sustentável e das novas tecnologias como exemplo claro desta alteração dos meios para atingir os fins.
Foco nas relações
Para o anterior Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades, o futuro depende muito das relações. «Somos o que somos pelas nossas características, mas também, e sobretudo, pelas relações que estabelecemos com os outros», adiantou, dando o exemplo do «hidrogénio e do oxigénio que, combinados na proporção certa, geram água, que é fonte de vida».
E é destas relações e das características que nos distinguem do «resto do mundo» que podemos mobilizar-nos. João Ferrão deu como exemplo o Arouca Geopark como forma de «mobilização e relação com o mapa global, uma plataforma a partir da qual se poderá construir futuro, pelas características únicas no mundo».
Mais do que soluções, o orador fez questão de orientar a plateia para as perguntas certas, a partir das quais se possa, com estas ideias, pensar melhor a construção do futuro.
O orador
Licenciado em Geografia, obteve o grau de Doutor em Geografia Humana, pela Universidade de Lisboa (UL). É Investigador coordenador do Instituto de Ciências Sociais desta Universidade, onde também lecciona em cursos de doutoramento e pós-graduação.
É Pró-reitor da UL para a sociedade e comunidades locais e Representante do Conselho dos Reitores das Universidades Portuguesas no CNADS (Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável). Tem desempenhado diversos cargos de relevância pública e política, nomeadamente: presidente da APDR – Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Regional; Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades no XVII Governo Constitucional; Membro do Conselho Científico das Ciências Sociais e Humanidades da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (Coordenador nacional de diversos projectos e redes de investigação internacionais) e Consultor da OCDE.
Tem coordenado diversos estudos de avaliação de políticas públicas, para o Governo português e para a Comissão Europeia e é conferencista junto de múltiplas instituições académicas e outras, em Portugal e no estrangeiro.
O «Círculo Mais Democracia»
O Círculo Mais Democracia é uma plataforma de acção cívica, que pretende «aprofundar o funcionamento democrático, possibilitando que cada um possa ser mais cidadão», como se pode ler no manifesto que enquadra a acção do grupo, sem pretender sobrepor-se «ao trabalho cívico que, felizmente, muitas outras instituições já desenvolvem em Arouca».
O território de Arouca é, assim, a matriz para a «realização de reflexões e debates que facilitem e permitam que cada um possa ser parte de uma sociedade e de uma democracia que sente como mais sua», afirma, também, o manifesto. Este Círculo, que já congrega mais de uma centena de arouquenses, é dinamizado por personalidades com raízes ou fortes ligações a Arouca.
Com a conferência do Professor Doutor João Ferrão dá-se início a um ciclo de debates sobre temas variados, que pretendem alargar a capacidade cidadã dos participantes, contribuindo, de forma activa, para o desenvolvimento do seu pensamento crítico e, de modo indirecto, para a projecção do nome de Arouca.
A próxima conferência deste ciclo terá lugar a 14 de Março, às 15:00, também no auditório da loja interactiva, com o tema «Mais de dois séculos de políticas florestais erradas», sendo o orador convidado o Prof. Doutor Américo Mendes, professor associado da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica (Porto) e presidente da Associação Florestal do Vale do Sousa.