Ontem cumpriram-se 29 anos sobre o desaparecimento de Francisco Sá Carneiro. Não quero ser sectarista ao ponto de esquecer Amaro da Costa, mas o facto é que, por engano ou não, por coincidência ou não, Portugal perdeu, naquela noite, o Primeiro-Ministro e, provavelmente, um dos mais brilhantes e influentes pensadores políticos que já conheceu e que, acredito, não encontrará, num futuro próximo, semelhante. A RTP, perseguindo, bem, o seu objectivo de serviço público de televisão, ofereceu ontem ao povo português um documentário extremamente bem realizado e documentado, onde vários especialistas, de várias áreas, são unânimes na prova da tese de atentado. Só que já é tarde. O Portugal de ambição, de concretização de anseios e liberdades, de busca da modernidade, do equilíbrio e justiça sociais, está, definitivamente, comprometido. Porque o seu principal visionário e construtor desapareceu. Concluo, assim, que é esse Portugal, que não quis a vanguarda, que rejeitou um futuro promissor, que decidiu enterrar-se nas querelas provincianas do costume, onde procuramos, todos, mandar mais que o vizinho; é esse Portugal, digo, o culpado por eu não ter conhecido Sá Carneiro.
«Quem representa o 25 de Abril é essencialmente o povo português. Que é que o 25 de Abril deu de essencial ao povo português? Liberdade, possibilidade de democracia e possibilidade de eleger. Quem representa o povo são os eleitores. Portanto se o 25 de Abril é representado pelo povo, se este, graças ao 25 de Abril, pode eleger, o povo pode exercer a democracia. Quem representa o 25 de Abril são os representantes eleitos pelo povo, mais do que ninguém, dado que esta data já não é uma revolução, foi-o, e ainda bem que foi. Agora somos um regime democrático e neste o critério reside na democracia representativa. Logo, a Assembleia da República, os seus deputados, a maioria, o Governo e o Presidente da República representam o povo português, logo o 25 de Abril».
«O Estado é um sistema bem coordenado de serviços e de instituições e quando estas funcionam mal não nos podemos conformar, porque equivale a favorecer a corrupção política e o mau funcionamento da democracia».
(Francisco Sá Carneiro, em entrevista à Rádio Renascença, a 13 de Janeiro de 1980)