10 de Dezembro de 2020 – Viagens, nos 100 anos de Clarice

Clarice Lispector faz 100 anos. Fui sabendo, pelas várias referências, mais ou menos veladas, pelos caminhos que fui trilhando, ao longo do dia. Para além das crónicas, da leitura de Clarice, o que me ficou foi uma certa solidão. Não sei se a que criou para as suas personagens, ou se a que transferiu de si para as suas palavras. Mas sempre aquela solidão onde se regressa a cada fim de dia. Essa solidão a partir de onde tudo nasce. E foi ao percorrer esse caminho que me voltaram, vívidas, as imagens de Itália. Onde regresso tantas vezes. Tal como se colou ao meu olhar a fotografia que te mostrei de Positano. Onde havemos de ir, antes ou depois de percorrermos os caminhos que serpenteiam por entre os trulli de Puglia. E, na boleia da fotografia, fogem do olhar três frases de Clarice, que como que estabelecem aquela solidão quotidiana como ponto de partida para qualquer viagem. ‘O mundo me parece uma coisa vasta demais e sem síntese possível’, diz algures, para, noutro lugar, dizer ‘mas um dia ainda hei de ir, sem me importar para onde o ir me levará’. Assim como, sobre outra viagem, da qual a partida não teve data fixa ou momento exacto, mas que se revelou uma aventura de descobrimento. ‘Não me lembro mais qual foi nosso começo. Sei que não começamos pelo começo. Já era amor antes de ser’.

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