2 de Dezembro de 2020 – Sá Carneiro

Mesmo tanto tempo depois da sua morte, a personalidade mítica de Sá Carneiro continua a pairar sobre a política portuguesa. A forma como sempre viveu e protagonizou a luta política é única e incontornável, e temos de concordar que Portugal não seria, certamente, o mesmo, caso o acidente de Camarate não se tivesse dado. Como escrevi há uns anos, quando Francisco Sá Carneiro morreu, eu ainda não tinha completado três meses de vida. Não fui, portanto, apanhado de surpresa pela perda, não o conheci em vida, não assisti à sua forma de fazer política. Sei de Sá Carneiro que passou pela vida com a velocidade e a força de um meteorito, deixando atrás de si um rasto de mudança, de força, muitas vezes de choque ou confronto com uma realidade que parecia custar cada vez mais mudar. Sei que não acreditava propriamente na revolução, mas antes na mudança construída a partir de dentro. Sei que não desistia facilmente de lutar pelas suas causas. Sei, também, que aquele Portugal ambicioso, cheio de anseios e liberdades, em constante busca pela modernidade, ávido de equilíbrio e justiça sociais, talvez já não exista. O Portugal vanguardista pelo qual Sá Carneiro lutava foi, praticamente, enterrado com o seu principal visionário e construtor. Aparentemente, Portugal desistiu da vanguarda, rejeitou um futuro promissor, decidiu dedicar-se às querelas provincianas do costume, onde procuramos, todos, mandar mais que o vizinho. Talvez seja esse Portugal o culpado por eu não ter conhecido Sá Carneiro.

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