Hoje, a palavra que ficou a martelar o tiquetaque do relógio foi ‘milagre’. Um milagre é algo de inexplicável, inesperado, impossível, diríamos. De certa forma, ver o Miguel Oliveira ganhar o Grande Prémio de Portugal é um ‘milagre’, embora saibamos que esse ‘milagre’ foi fruto de muito treino, trabalho, persistência, foco, e uma imensidão de outras coisas. Conheci, sem saber, a Cristina, mãe do Miguel Oliveira, num retiro em que trabalhámos as emoções, juntamente com dezenas de outros amigos, e, olhando para esses dias, percebe-se bem de que tipo de fibra o Miguel é feito. Mas houve outro ‘milagre’ a martelar o tiquetaque. Há alguns anos que conheço o padre José Paulo Teixeira. Dos tempos em Moldes, em Janarde, em Albergaria da Serra, em Silveiras, em vários sítios onde fomos, com ele, levar um pouco de música a algumas celebrações, como naquele Ano Novo com neve, em que tínhamos o povo (e ele) à nossa espera fora da igreja, entre outras peripécias. O padre Paulo é, em si mesmo, um ‘milagre’. Um ‘milagre’ em movimento, que não pára, que precisa de estar em movimento, em transformação, em construção permanente. Talvez tenha sido por isso que lhe foi confiada a capelania do Hospital de São João, onde vai percorrendo, diariamente, os quase vinte quilómetros de corredores, levando o conforto de uma palavra e a ‘escuta activa’, de que fala na entrevista ao ‘Expresso’, aos vários doentes. O padre Paulo tem visto que, com esta coisa da COVID, os profissionais de saúde não têm tempo sequer para pedir este tipo de ajuda, de que muitas vezes precisam. E os doentes, por vezes, também já não têm condições físicas e anímicas para o fazerem. Mas também ali há ‘milagres’. Como as curas de que a Bíblia nos fala, se bem que talvez de forma um pouco menos espectacular. O que é certo, é que eles acontecem, e o padre Paulo ajuda a fazer acontecer.
Há muitas histórias com final feliz. Vemos muitas histórias extraordinárias. Algumas pessoas, para me provocarem, dizem-me: ‘senhor padre, isto foi milagre’. Milagre foi, sem dúvida. Mas da medicina, da enfermagem, da ciência e da força de cada pessoa. Não serão os milagres que as pessoas querem ver, mas todos os dias, e várias vezes ao dia, eu vejo milagres no hospital. E desses dou testemunho, e luto por eles todos os dias
Padre José Paulo Teixeira (capelão do Hospital de São João, Porto), ao jornal ‘Expresso’