Acabo de receber de presente de viagem o álbum “Maurice Ravel”, da dupla de pianistas (e irmãs) Katia e Marielle Labèque. Conheci as irmãs Labèque por causa da performance original do famoso “Bolero”, de Ravel, com o trio basco “Kalakan”. Devo o presente (autografado, ainda por cima) ao meu grande amigo Avelino Vieira, que me deixou roído de inveja por não ter podido ver o concerto que juntou as irmãs Labèque aos “Kalakan”, no Théâtre des Champs-Élysées, em Paris. É curioso que, numa altura em que as plataformas comerciais da música nos permitem passar, de um segundo para o outro, do mais erudito ao mais espontâneo, continuemos a ser exigentes na forma como os concertos são organizados e orientados. Pois bem, estes músicos fazem questão de romper com os rituais que presidem aos tradicionais recitais pianísticos, por exemplo. Antes procuram interrogar-nos através do ouvido, romper com hábitos. Não discriminam a (excelente) música folclórica, antes a colocam lado a lado com a música erudita, rompendo discriminações e rasgando novos ritmos, cores e horizontes. O disco só traz Ravel. A dois pianos, que soam como um só. É como se, com toda a delicadeza, nos colocassem as paisagens sonoras do compositor na ponta dos dedos.