Há precisamente setenta e sete anos morreu Fernando António Nogueira Pessoa. Ninguém saberá de cor a sua vida, nem a sua obra, nem a sua morte. Como ninguém saberá onde é a verdade e a ficção. Onde é ele e onde é outro. É perigoso considerá-lo o maior escritor português, se é que há maior. Mas terá sido, pelo menos, um dos maiores. Ninguém saberá de cor decifrá-lo com exactidão. Mas os que o admiram, e se deixam tocar por ele, ficam sempre com a vontade de ser com ele, de olhar pelo olhar dele, por querer mais dele. Ver com ele o que se vê da janela do escritório ou da sua aldeia, sentir com ele a solidão do quarto, passar com ele pelas ruas do Chiado. Sofrer com ele. Ver com ele. Sem o decifrar. Sem o saber todo. Que importa? Ante ele, as palavras que usamos são trémulas e poucas e insuficientes para as imagens que temos. Viveu só. Morreu só. Hoje é lido, conhecido, citado. O humilde guarda-livros de Lisboa. Sozinho. Sempre.